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Bonitinha

Bonitinha. Está simplesinha, mas bonitinha.

Ela me disse isso assim, de repente, no meio da rua. Nunca a havia visto antes. Seus seios, grandes e sem sutiã, me chamaram a atenção. A camiseta estava larga e suja, a calça também. Morava na rua e, justamente quando eu passei, ela disse isso.

Agradeci o elogio e continuei andando, pensando em quantas vezes na vida recebemos um comentário alheio sem ter pedido. Ao mesmo tempo em que meu raciocínio voou entre pensamentos como “sim, eu realmente sou um para-raios de maluco”, “nossa, ganhei uma personal stylist na rua” e “é verdade, é simples mas é bonito”, ouvi o término de sua fala:

Posso falar do seu vestido pois, quando eu era gente, eu desenhava roupas.

Quando eu era gente. Ela disse isso com um certo tom de normalidade, com a mesma intenção que formulou a frase a respeito do meu vestido. A mesma frase que me taxava como simplesinha mas bonitinha lhe tirava o primordial para um ser humano se considerar gente: a identidade. A partir de que momento ela deixou de ser gente? A partir de que momento ela deixou de desenhar vestidos? A partir de que momento ela passou a se vestir com roupas que não lhe cabem? Ou melhor, a partir de que momento aquele ser humano deixou de ser mulher para tornar-se não-gente?

A realidade muita vezes aparece no meio da rua, assim, gratuita. Simples como o meu vestido. Nem sempre tão bonitinha.

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Peles na Moda: uma questão mais ampla.

As coleções de inverno estão nas araras e em várias marcas é possível ver peles de animais verdadeiras. A pergunta é: vale tudo na moda? Será que já não discutimos o suficiente a crueldade que é matar animais para fazer casacos de pele? A resposta é não. Atualmente a questão da pele na indústria da moda ainda não é totalmente questionada, mesmo com os inúmeros protestos de organizações de defesa dos animais. Porém, não discutimos ainda com clareza a questão dos direitos dos animais. Não só na moda, mas também em nossos hábitos.

Aviso que esta não é uma questão de dizer que matar vaca para o bife pode e matar raposa para casaco não. É preciso refletir sobre inúmeras questões. Somos, em sua grande maioria, criados como onívoros, estamos acostumados a comer carne desde a pré-história. É um hábito e dependendo do país em que você vive pode-se comer cachorro ou não, por exemplo. Ou pode-se ter uma ótima culinária vegetariana como é o caso da Índia. No caso específico do Brasil, a pecuária é um dos grandes meios de produção da economia. Somos um povo acostumado a comer carne de vaca, frango, porco, peixe entre outros animais. Porém, não somos um país que culturalmente mata raposas e coelhos para fazer casacos de pele. É preciso refletir sobre nossos hábitos alimentares e sobre a cadeia de produção de alimentos da qual fazem parte. Métodos de abate em grande escala na maioria das vezes não respeitam nem os animais e nem os trabalhadores envolvidos. Vemos o reflexo disso também na qualidade da carne que consumimos. Portanto, a carne que comemos e o casaco de luxo não fazem parte da mesma cadeia de produção, mas estão interligados dentro da nossa relação com animais.

Animal Patterns. Crédito da Imagem: Elfike no Flickr, em CC

Quando falamos de direitos dos animais é preciso falar do uso de peles na moda, mas também de tráfico de animais silvestres, das penas naturais usadas em alegorias durante o Carnaval, dos animais abandonados por seus donos, dos zoológicos, da caça indiscriminada, dos maus tratos, das condições de abate em frigoríficos e dos nossos hábitos de consumo de carne e derivados animais. O que podemos fazer para mudar essa situação? Qual nosso nível de respeito pelos animais? Matar animais é justificável dependendo de como os usaremos? Precisamos matar animais para vivermos? É importante levantarmos todas essas questões. Porém, focar em uma delas em determinado momento não significa fechar os olhos para outras. E a grande questão quando falamos de moda é: há substitutos. Há materiais de qualidade que podem substituir facilmente a pele verdadeira de animais em vestimentas. Então, quanto vale um look? Quanto vale uma tendência?

É importante refletir individualmente sobre nossas ações. Podemos virar vegetarianos, podemos virar veganos ou podemos diminuir a quantidade de carne que consumimos. Podemos fazer boicotes a empresas que não realizam abate humanizado e empresas que vendem pele e couro de animais verdadeiros. Podemos denunciar o tráfico de animais silvestres e não aprisioná-los em cativeiro. Ações individuais e reflexão constante sobre nossos hábitos de consumo são fundamentais para mudar nossas relações com o mundo. Muitas vezes não são suficientes para modificar os meios de produção, mas ao vermos que uma empresa decide tirar das vitrines peças de sua coleção que exalta peles de animais em decorrência dos protestos, é possível ver uma pequena vitória dentro da ampla questão dos direitos dos animais. Ações individuais são nossa responsabilidade, além de serem catalisadores de ações coletivas. Quando o presidente de uma grande empresa de moda afirma que não é responsável pelo debate de uma causa tão ampla e controversa, justificando que pele de animal é tendência, quem assume a responsabilidade? Cada um de nós deve assumí-la.

Este post faz parte de uma Blogagem Coletiva proposta pela Renata Checha. Outros posts participantes:

#ArezzoFail!

A Arezzo e a Minha Pele

A Polêmica das Peles

A terceira lei de Newton e o caso arezzo

A Vênus das Peles – Leopold Von Sacher Masoch

Arezzo e algumas outras ignorâncias

Crueldade animal NÂO está na moda

Não é nossa responsabilidade?

O Tiro no Pé da Arezzo

Pele está na moda? Fique fora de moda!

Peles, Pra Que Te Quero?

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Rita Miller é meu nome

Oda Mae Brown como Rita Miller
Oda Mae... Não, não, meu nome é Rita Miller! Rita Miller, Rita Miller é meu nome!

Como começar?

É bem mais fácil escrever na lista de email, que tem assunto novo todo dia. E pra minha mente pegar fogo, lá tem faísca à beça. Mas como recusar um convite da Luluzona Freitas pra me expressar nesse espaço que valorizo tanto?

Sou uma pessoa muito grata por poder fazer parte dessa rede, dessa grande união de forças que é o Luluzinha Camp.

Minha ideia é poder trazer a vocês histórias de mulheres que mudaram muito ou mudaram pouco, mas que fizeram diferença nesse mundo. E, também, dar uma pequena e possível contribuição para que você faça a diferença (continue conosco nos próximos posts, oká?). Então, acho que devo mesmo começar falando sobre as mulheres que fazem a diferença na minha vida todos os dias. Afinal, é isso que o Luluzinha Camp is all about.

Posso dizer com toda a segurança que hoje sou uma pessoa diferente por causa do Luluzinha Camp. Quando quis chorar, chorei no ombro desse grupo. Quando quis entender, perguntei a esse grupo. E quando quis me aceitar, elas estavam lá, me aceitando.

Quem me conhece, sabe que gosto de imitar vozes (não só a do Silvio Santos, tá? :P). Uma das minhas imitações preferidas, ainda que precise de arroz com feijão pra ficar mais fortinha, é a de Oda Mae Brown, a vidente charlatã encarnada – cof, cof – por Whoopi Goldberg no filme Ghost (na verdade, tento imitar sua dubladora Selma Lopes). Oda vê uma forma de redimir-se dos anos de enganações ajudando Sam (Patrick Swayze), já morto, a roubar quem lhe roubou e causou sua morte. Para isso, Oda se transforma em Rita Miller, titular de uma conta fantasma (tudumpshh), usada para desviar dinheiro. Logo depois de dar esse arriscado golpe “do bem”, Oda faz planos para o dinheiro sacado: “vou colocar minha irmã num SPA, ela está muito gorda!”, mas, relutante, doa o dinheiro à caridade, e depois percebe que a sua caridade é para com Sam.

Oda é uma mulher divertida, em busca de redenção, triste, cara-de-pau, fútil e generosa, e é Rita, tudo ao mesmo tempo. E que mulher não pode ser tudo ao mesmo tempo? Isso é algo que aprendi no Luluzinha Camp. Dá pra ser o que eu quiser, sem abrir mão de ser várias, e, principalmente, de ser quem sou. Também dá pra gritar “não quero ser nada disso”!

E vejo tanto disso em todas vocês. Esse grupo me ensinou a ver a realidade sem lentes cor-de-rosa, a tirar as situações de seus estereótipos, e, mesmo assim, achar que esse mundo tem jeito. Posso dizer que agora vejo um espectro, e nele cabe o berrante magenta do conjuntinho de Rita Miller.

Pra mim, o mais legal do Luluzinha Camp é ver que, num grupo só de mulheres, há tanta pluralidade. Um tapa, com as costas da mão, em quem acha que mulher é tudo igual. 🙂

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Pelos poderes de Grayskull

“Dirija que nem homem” disse meu pai enquanto me ensinava a trocar as marchas. Longe de ser um comentário machista, ele na verdade queria dizer que eu deveria encarar aquela situação de forma racional e decidida. Utilizar mais o lado objetivo do meu cérebro e menos o lado sensível. Mais razão e menos emoção.

Eu cresci com muitos meninos em volta, principalmente meu irmão e meus primos. No caso do meu irmão, inúmeras foram as vezes que tive que brincar de Barbie no castelo de Grayskull. Não sei se alguém de vocês já tentou fazer isso, mas existem alguns fatores engraçados nessa modalidade. Um deles é que a Barbie, do alto de seu 1,75m de altura, é bem maior que o He Man. Se eles tivessem que formar um casal, ele seria o baixinho cotoquinho da relação. Ou seja, enfiar a Barbie no castelo de Grayskull era uma tarefa árdua, numa casa com teto pequeno e espaço suficiente para alguém do tamanho do He Man.

Para piorar, o castelo tinha uma alavanca que, ao ser puxada, abria um tapete e fazia com que o “inimigo” caísse no andar abaixo. Oras, para a brincadeira acontecer, o embate teria que ser entre eu e meu irmão. Barbie X He Man. E na hora que ele puxava a alavanca, a Barbie ficava presa no vão do tapete, com os braços entalados, sem conseguir sair por baixo ou por cima.

Metáforas a parte, acho que é justamente disso que estamos falando. De uma mulher que ainda não sabe se cabe ou não em todas essas casas. Que ainda se sente desengonçada batendo a cabeça no teto, mas que tem vontade de ficar passeando por lá. Que está entendendo onde e como pisar no castelo de Grayskull sem danificar o esmalte ou ser julgada por se preocupar com isso. Esquizofrênica ou não, hoje posso dizer que dirigir que nem homem pode ser bom. Mas dirigir que nem homem com salto, meia-calça e batom é melhor ainda.

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Apropriação indébita do @luluzinhacamp

Darth Vader Hello Kitty
Sim, o lado negro se disfarça de todo jeito

imagem do Hello Kitty from Hell

Sucesso sempre tem um gosto bom, mas a gente precisa lidar com o lado negro da força o tempo todo. Desde o início do LuluzinhaCamp, há três anos, o grande esforço – meu e das coordenadoras – é formar uma comunidade e evitar interferências “comerciais”. Claro que a gente adora os nossos patrocinadores e apoiadores. Só que tem muito sapo de fora que, depois de dizer em alto e bom som que não é luluzinha, contando com o esquecimento geral e recorrente, tenta usar a base #luluzinhacamp para “se fazer”.

Feio? Horrível. E faz parte. Por isso mesmo escrevo este pequeno post. Não acredite em qualquer @ tuitando sobre o LuluzinhaCamp. Seja crítica: esta pessoa participa da comunidade? Apóia a gente nos eventos? É presente? Seu(s) blog(s) faz(em) parte do nosso blogroll? Está do nosso lado ou quer usar a ingenuidade de quem está distraída como escada? (expressão teatral para “usar o outro pra aparecer”)